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DIVERSÃO: ESSE NEGÓCIO
 Luiz Angelo Pinto

 

FORMAR QUADRILHAS. UM DIREITO GARANTIDO PELO ESTADO

GAMES NEWS Nº 57 - JUL/AGO/99

 

 

 

De que servem e a quem servem certas leis?

Qualquer sociedade que se preze precisa ter seu corpus juris, seu conjunto de leis que a regula e ordena. Mas não vou discorrer aqui sobre esse tema.

As sociedades são dinâmicas, mudam a cada momento. Mudam as necessidades, os valores, as formas de produzir, de trabalhar, de se divertir, de se utilizar do tempo ocioso. O sistema legal que rege uma sociedade nem sempre, para não dizer quase nunca, muda em consonância com as necessidades de cada nova situação.

Sempre cabe a pergunta: de que servem e a quem servem certas leis?

Há leis que vão ficando, mesmo depois de ter mudado a situação em que surgiram e foram úteis. Há outras, de nebulosa origem, que nunca se soube bem a que vieram e, mesmo assim, vão ficando. E vão atrapalhando. E vão criando dificuldades, E vão emperrando o bom andamento, o bom funcionamento da sociedade. E vão dando azo ao achaque, à extorsão, à corrupção.

Corrupção não é só uma questão de ética, de moral individual, de honra. A corrupção aparece, se instala, se implanta e se mantém porque e quando há condições sociais, operacionais e jurídicas para isso. Há situações em que o roubo, por exemplo, é praticamente impossível. Um caixa de banco é honestíssimo. Milhares ou milhões de reais passam diariamente por suas mãos e nem um centavo é desviado. O tipo de controle a que está submetido não permite deslizes. Já um balconista de boteco, quando o dono não está presente, pode muito bem "se esquecer" de registrar no caixa a venda de um ou outro sanduíche. As condições, mais do que as "profundas convicções morais" acabam por determinar se uma pessoa é, ou não, honesta.

Mas voltemos ao tema da relação entre Leis e Corrupção.

Há leis que estão aí só para permitir a corrupção. Por meio dessas leis o Estado acaba sendo o primeiro e principal promotor e incentivador da formação de quadrilhas.

Há pouco tempo a imprensa descobriu a "máfia dos fiscais" na Prefeitura de São Paulo. Na verdade os fiscais eram só a ponta de baixo. A quadrilha incluía administradores regionais, vereadores e mais todo um bando de peixinhos e peixões. Denúncia pra cá, cassação pra lá, uma ou outra prisão. O show completo. Farta festa e longas filas de clientes para advogados criminalistas. A imprensa, particularmente o jornal O Estado de S. Paulo, fez um excelente trabalho. Não deixou barato. Mas ficou faltando discutir e chamar a atenção para um aspecto desse problema.

Afinal, por que há tantos bandidos em todos os escalões da administração municipal? Seria só uma questão de tirar de lá as pessoas erradas, desonestas e substituí-las por honrados cidadãos? O que vai acabar acontecendo com esses "honrados cidadãos" quando adquirirem um pouquinho de poder e entrarem em contato e conúbio com a quadrilha e descobrirem a "Legislação Municipal"? Legislação Municipal — leia-se: uma emaranhada selva selvagem, um cipoal enchendo volumes com proibições, restrições, limitações, regulamentos abstrusos, cuidados exagerados ou simplesmente inúteis e tantas e tais matreiras mutretas. Tudo para impedir e dificultar as atividades mais elementares — construir ou reformar uma casa, comprar ou vender mercadorias, prestar serviços, divertir-se. O emaranhado de leis põe tudo e todos na clandestinidade — uma perua que transporta passageiros, suprindo as deficiências do transporte coletivo "oficial" explorado por meia dúzia de privilegiados "amigos do rei"; um restaurante cujo pé direito da cozinha não está exatamente da altura que consta nas "escrituras"; um estacionamento que não tem "alvará"; uma loja de diversões que está "muito perto" de uma escola; uma padaria que comete o crime de, além de vender pão, colocar à disposição dos fregueses uma máquina de videogame... e vai daí por diante. Um amigo, arquiteto, que trabalhava em Zurique e veio a São Paulo espantou-se com a jóia preciosa que é nosso Código de Obras. O de Zurique, disse ele, não tem mais do que dezenove páginas.

No nível municipal, para não falar em outros níveis, é essa legislação que permite e propicia a corrupção. É o Estado garantindo o direito de formação de quadrilhas. É o achaque institucionalizado. É o Estado garantindo a permanência e a continuidade da extorsão, da corrupção. Não fosse esse corpo de leis elaborado ao longo de décadas de incompetência e irresponsabilidade e não haveria condições materiais para a corrupção. Não adianta, pois, somente uma campanha moralista contra os políticos ou os fiscais desonestos. A desonestidade é inerente ao sistema. Mude-se o sistema legal adaptando-o às reais necessidades da sociedade e esses doninhos do poder não terão o que vender. Se não houver dificuldades criadas, ninguém poderá vender facilidades.

Há uma lei municipal — Lei do Zoneamento — que estabelece, na área urbana, quais devem ser as regiões estritamente residenciais, quais podem ser comerciais e quais industriais. Há, por outro lado, uma limitação, por força ainda de legislação municipal, que fixa, congela, cristaliza o que uma empresa pode ou não pode vender ou quais serviços pode e quais não pode prestar. Salvo em questões muito específicas tais como segurança, por exemplo, não há por que criar essa limitação. Há serviços, é claro, que não podem ser prestados em qualquer lugar e produtos que não podem ser comercializados por qualquer empresa — armas, explosivos, certos produtos químicos que requerem manuseio especializado etc. Mas não há qualquer motivo razoável para que um bar precise de "alvará" para operar uma mesa de bilhar ou pebolim. Não há por que uma padaria não possa usar parte de seu espaço para colocar à disposição de seus fregueses uma máquina de diversões eletrônicas.

A obrigatoriedade de "alvará" não faz mais do que dar margem à corrupção, à extorsão, ao achaque.

Havendo a lei que exige "alvará", sempre haverá um diligente fiscal ameaçando o pequeno empresário com altas multas, fechamento administrativo ou... Bem, sempre é possível um "acerto". E é disso que vivem as quadrilhas mantidas e garantidas pelo Estado.

Não esperemos que esses vereadores que estão aí façam alguma coisa de decente para sanear essa legislação. Não há competência nem responsabilidade suficientes e, menos ainda, interesse. Boa parte desse pessoal vive disso e não vai matar a galinha dos ovos de ouro.

E há mais, indo além do âmbito municipal.

Dizem que por força de uma velha lei da década de 40, o jogo é proibido no Brasil. É mentira. Há jogo, sim, no Brasil. É explorado pelo Estado — Loto, Sena, loterias várias. É explorado por meio de canais de televisão — Papa Tudo, 0900 etc. Os bancos também não ficam atrás. Itaú, Unibanco, Bradesco, só para citar os últimos dos quais vi propaganda, dispõem, para seus clientes, de produtos que são um misto de títulos de investimento e loterias. Você aplica e concorre a prêmios... É jogo. E há um bingo em cada esquina. E tem o jogo do bicho, e tem cassinos... (tem, sim. Procure que você encontra). E tem caça-níqueis em todos os bares, padarias e lanchonetes.

Parte desses jogos é considerada legal e explorada por poucos privilegiados. Outros são considerados ilegais e, para não serem vistos, pagam a polícia.

Deixemos de hipocrisia. A atividade existe, está aí. Não prejudica a ninguém. É lazer, é diversão. Não há por que tentar impedi-la. O melhor que se faria seria acabar com essa legislação contorcida que não faz mais do que promover a corrupção. Mas vamos devagar. Deve haver muita gente interessada em manter essa situação, manter os privilégios dos poucos que exploram o jogo legalmente e manter as "taxas de proteção" pagas por quem não tem a felicidade de participar do seleto grupo de bancos, canais de televisão, bingos legais e não sei o que mais.

Não esperemos muito do Poder Legislativo. Há lobbies demais, interesses demais e inteligência de menos.

Mas, felizmente, o Poder Legislativo não é o único que tem voz. Quando as leis são iníquas, quando os legisladores não estão nem aí ou estão aí só para defender os próprios interesses ou os interesses dos lobbies que os pagam, o melhor que se faz é recorrer ao Poder Judiciário. Mas o Judiciário, é claro, só atua quando acionado. E cabe a quem se sente prejudicado acioná-lo.

Há instrumentos e recursos para derrubar, tornar sem efeito leis iníquas.

Se nós, empresários do ramo de diversões, estamos sendo prejudicados, ameaçados na nossa atividade por leis sem pé nem cabeça, cabe a nós recorrer ao Poder Judiciário.

Em vez de pagar fiscais e policiais, vamos contratar advogados criar e fazer valer nossos direitos — direito de trabalhar, direito de propiciar lazer, direito de cidadania. Não somos bandidos, não temos nada a esconder, nada a temer. Bandidos são, isso sim, todos aqueles que tentam nos achacar no nosso trabalho. Bandidos são aqueles que tentam criar e manter uma legislação que tem por único objetivo a extorsão.

Vamos derrubar essas leis que tentam criminalizar nosso trabalho. Vamos acabar com essa galinha e com seus ovos de ouro. E não será a primeira vez que fazemos isso.

 
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última modificaçao: October 24, 2001